Faz cerca de trinta anos que um,
então, jovem escritor de Ficção Científica
dos Estados Unidos embarcou num avião com
destino a Londres. Porquê? Porque, nas suas
próprias palavras, era lá que as coisas
aconteciam. Trazia consigo um romance genial que
não encontrara editor na sua terra natal.
Encontrou guarida numa revista que gostava da
diferença, gostava de arriscar. NEW WORLDS, cujo guru, o sr. Michael
Moorcock, que os portugueses conhecem como autor
de alguns livrinhos de fantasia heróica (produto
que ele escrevia apenas para manter
financeiramente viva a sua revista), desbravava,
no longínquo país exótico que são os anos
sessenta, terreno novo para a FC. Novos estilos,
novas preocupações, novas vozes. BUG JACK BARRON funcionaria como uma das
primeiras denúncias do poder de manipulação
dos media; e contudo, mesmo publicado em
fascículos numa revista avant-garde, underground,
de um género menor considerado literariamente
infantilóide, o romance seria impugnado no
Parlamento inglês, e a NEW WORLDS correria o perigo de encerrar as
máquinas.
Isto ensina-nos, antes de
tudo, que quanto mais surrealista, mais os
Poderes Instituídos prestam atenção à arte.
Mais forte e perversa é a sua forma de moldar a
consciência popular. Uma forma cáustica e
irreverente. Ensina-nos, também (mas nós já
sabíamos), que a FC é, apesar de tantos
insultos, importante, e, quiçá, indispensável
para a formação da mentalidade urbana moderna.
Spinrad, na sua conferência, ontem, na Loja FNAC
do Colombo, falou dos problemas da FC moderna, e
da tentativa (grotesta) da Disneyização
da arte: ou seja, retirando-lhe tudo o que é
dor, reinventando a história de modo a ficar
inofensiva. Fazer desenhos animados de grandes
tragédias dramáticas (o caso do corcunda de Notre
Dame). O futuro da FC não é brilhante, mas
a solução talvez se encontrasse fora do mundo
anglo-saxónico, aqui, na Europa, onde, segundo
afirma, é onde as coisas estão a acontecer,
hoje.
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