Imagem familiar: o escritor de
ficção científica debruçado sobre tomos de
física e química, anotando equações sobre
espaços curvos, calculando a velocidade da luz e
a dilatação do tempo perto de wormholes,
entradas em órbita, o efeito de uma nuvem de
poeira estelar sobre o albedo do planeta e sobre
a vida que alberga, os óculos pendendo-lhe do
nariz, o jantar a arrefecer, esquecido, há horas
na mesinha do lado, a lua em quarto crescente a
encimar a paisagem que observa da janela. A
figura do cientista maluco transposta para o meio
literário.
Imagens menos familiares:
Phil K. Dick com alucinações psicadélicas
provocadas pelo ácido lisérgico. Rudy Rucker no
meio de uma plateia em Nova Iorque a assistir a
um espectáculo pornográfico. John Shirley a
tocar numa banda de heavy metal. Samuel Delany a
assumir na imprensa a sua bissexualidade e depois
publicar um testamento autobiográfico sobre
literatura e sexo onde conta algumas das
relações diversas que ele e a sua esposa
poetisa mantiveram, à la Henry Miller,
June e Anaïs. H. Beam Piper, caído em tão
completa miséria que comia os pombos que
pousavam no parapeito da sua janela, a
suicidar-se a tiro cinco anos antes da expansão
de mercado da década de setenta que tornou os
grandes autores de FC em bestsellers.
Charles Beaumont devastado por uma doença rara
que o fez envelhecer décadas em poucos anos.
Alice Cooper, mais conhecida por James Triptree,
Jr., a matar o marido, que sofria da doença de
Alzheimer, e depois a suicidar-se a ela própria.
Mervyn Peake a tombar lentamente na
esquizofrenia. Alan Dean Foster a receber um copo
de vomitado quente no rosto, por um fã queixoso.
Harlan Ellison assolado por ameaças de
assassinato.
A lista continua. Cada
género tem os seus escritores, e o que a lista
revela é que os escritores são pessoas como
quaisquer outras, sujeitas aos desígnios do
destino e da vida.
Mas as suas obras
permanecem. Tornam-se em testemunhos.
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